Nove da noite. O telefone toca.
- Vinho?
- Vem.
Desde que nos conhecemos que meias palavras bastam. Desde que os nossos olhares se cruzaram que percebemos que não vale a pena fugir do que é óbvio. Do amor e da pura sensação de nos sentirmos amados e confortáveis. Conheci-o no meio de loucos, de pessoas instáveis de coração nas mãos, no meio de ruas onde havia a duvida, a instabilidade, a falta de qualquer coisa. Gostava daquela pessoa. Gostava de tentar perceber o que acontecia dentro daquela cabeça quando se cruzava comigo, por coincidência, ou não. Escondia-se atrás do fumo dos cigarros, frente a frente - discretos -, tocava nas minhas pernas com a ternura de um homem quase apaixonado. Trocámos caricias debaixo da mesa e sorriamos para o ar, como malucos, e no fundo era mesmo isso que éramos. Quisemos criar um segredo juntos, preferimos mergulhar em olhares e toques antes de tentarmos se quer entender se tudo aquilo teria alguma espécie de essência, se éramos reais aos olhos um do outro. Sentíamos-nos iguais no meio de conversas de café que enchiam o tempo e os nossos corações.
A campainha toca. Abro e um beijo na testa arrepia-me o corpo. Senta-se no chão, abre a garrafa, serve-me. Puxa-me por um braço e deita-me no seu peito. Depois do silêncio vem o entendimento. Somos nós, desde o primeiro dia. Tudo o que sempre quis. Uma pessoa que entende o meu silêncio e que me acompanha no mesmo, que me protege no meio dos seus abraços musculados e que me arrepia num todo com a sua respiração no meu ouvido. O ambiente está como deve estar. Leve. Apetece-me tapar todas as suas tatuagens com o meu corpo e desenhar na sua pele a minha serenidade quando me procura. Enquanto lhe mexo na barba observo todos os seus traços, adormecidos no silêncio dos nossos olhares. As paredes ouvem-nos sem termos que falar, entre cigarros marcados de batom, entre garrafas vazias, entre mãos dadas.
- Embebeda-te comigo. Quero uma noite de esquecimentos.
- Só não te esqueças de mim, Filipa.
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